Palácio da Pena: de ermida Mariana a residência de verão

Tempo de Leitura: 6 minutos

Atualizado em 30/04/2024 por Sylvia Leite

Matéria Palácio da Pena - Foto Singa Hitam em Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAQuem já visitou ou leu um pouco sobre monumentos da Península Ibérica, sabe que, em consequência da ocupação islâmica, que durou cerca de sete séculos, não é raro encontrarmos na Espanha e em Portugal igrejas que já fora mesquitas, ou palácios que pertenceram, em diferentes épocas, a muçulmanos e cristãos. Basta olharmos os exemplos da Mesquita-catedral de Córdoba e do conjunto monumental de Alhambra.

Mas, por incrível que pareça, esse não é o caso do Palácio da Pena, em Sintra, que embora possua inúmeros elementos islâmicos de arquitetura e decoração, nunca pertenceu a muçulmanos. O seu diferencial histórico é o fato de ter nascido como uma ermida que deu origem a um mosteiro, isto é, como uma construção religiosa erguida em local místico, e de haver se transformado em um edifício civil, mais precisamente em uma residência de verão.

Conta a tradição que a ermida surgiu depois de uma aparição da Virgem e foi dedicada a Nossa Senhora da Pena. Na época já havia, em Sintra, a Igreja de Santa Maria e eram os religiosos dessa paróquia que se responsabilizavam pelo pequeno monumento, cuidando e rezando missa todos os sábados.

A ermida começou a ser conhecida em 1493, quando recebeu a visita dos reis D. João II e D. Leonor, para pagamento de promessa a Nossa Senhora da Pena, mas a ordem para a construção do convento só veio em 1503, no reinado de D. Manuel I, que doou o santuário à Ordem de São Jerônimo.

Palácio da Pena: a obra de um rei artista

Matéria Palácio da Pena - Foto de desconhecido em Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAO mosteiro se manteve por mais de dois séculos até que, em 1755, foi praticamente todo destruído pelo famoso terremoto de Lisboa, sobrando apenas a capela e algumas obras de arte. Mesmo em ruinas, o  continuou funcionando até a extinção das ordens religiosas em Portugal. Sua reconstrução só foi iniciada quase um século depois do incêndio, por ordem do rei D. Fernando II, que decidiu transformá-lo em residência real.

Mesmo tendo entregue a obra ao arquiteto amador alemão Wilhem Ludwig von Eschwege, Fernando II e sua mulher Maria II, fizeram questão de opinar nos detalhes e na decoração, misturando propositalmente diversos estilos – neogótico, neomanuelino, neo-islâmico, neo-renascentista, além de elementos indianos – e demonstrando grande preocupação com detalhes estéticos e simbólicos do palácio.

Matéria Palácio da Pena - G. Vivian Domínio público em Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIANão se sabe ao certo se esse preciosismo se deveu apenas à sensibilidade de Fernando II, conhecido como o ‘Rei Artista’, ou se ele e a rainha inspiraram-se na padroeira do local. É que Nossa Senhor da Pena é considerada a protetora daqueles que trabalham com arte e literatura. O título foi atribuído à Virgem Maria durante a renascença porque era a ela que artistas e escritores pediam inspiração para seus trabalhos.

O resultado, seja qual for a causa, é que o Palácio da Pena encantou o mundo com sua aparência colorida e exótica, que nos faz lembrar os mais extravagantes contos de fadas. Apesar da mistura de estilos, é reconhecido como um edifício de arquitetura Romântica – um dos mais importantes do mundo e o primeiro da Europa. Hoje, além de receber milhares de visitantes a cada ano, está listado como ‘Patrimônio Mundial da Humanidade’, pertence à ‘Rede de Residências Reais Européias’ e é considerado ‘Uma das 7 Maravilhas de Portugal’.

Cores, estilos e citações

Matéria Palácio da Pena - Foto Sylvia Leite - BLOG LUGARES DE MEMÓRIANão é pra menos. Além de sua reconhecida beleza, o prédio esbanja originalidade. Diferente da maioria dos palácios, que alicerçam suas belezas em estilos puros ou com poucas misturas, o da Pena é um verdadeiro festival de tons, referências e citações.

Pelo menos quatro cores predominam em seu exterior: o vermelho, que demarca a parte reconstruída a partir das ruinas do antigo convento; o amarelo da pintura do chamado Palácio Novo e o azul dos azulejos que revestem parte de sua fachada; além do branco que está em praticamente todos os detalhes.

O arco localizado na rampa principal de acesso ao palácio é claramente inspirado na Porta da Justiça de Alhambra – a cidade construída pelos muçulmanos em Granada, na Espanha. Além de repetir a forma, possui, como a porta espanhola, uma pequena chave esculpida em relevo.

Uma segunda passagem, que leva à área residencial do prédio, e é conhecida como Porta Monumental, faz referência a vários monumentos portugueses, em especial à Casa dos Bicos – construção de 1523, localizada em Lisboa, cuja fachada de pedra é decorada com relevos em forma de diamantes lapidados.

Por fim, o Pórtico de Tritão reúne azulejos tipicamente portugueses, além de ter como principal ornamento uma imagem de Tritão – um deus marinho na Mitologia Grega, filho de Poseidon e Anfitrite.

Matéria Palácio da Pena - Foto Carlos Luis M C da Cruz Domínio público em Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIA

Elementos dos mais diversos estilos estão em toda parte: o Terraço dos Arcos, área de entrada do Palácio Novo, é um dos traços islâmicos mais evidentes de toda a construção, mas o estilo mudéjar, ou neoislâmico, está presente, também, na parte reconstruída, por meio de vários detalhes decorativos como, por exemplo, os estuques com padrões geométricos que revestem paredes e tetos do aposento da rainha D. Amélia e da Sala de Fumo. Já a capela, única parte do antigo convento que escapou ao incêndio, é toda em estilo Manuelino.

Assim como no prédio em si, há uma mescla, também, na área externa do palácio, planejada para conter árvores e plantas de todos os cantos do mundo. São mais de 500 espécies espalhadas em diversos jardins, desenhados sob influência do Romantismo. O mais famoso talvez seja o das Camélias, espécie originária do Japão e da China e introduzida no palácio, em 1840, pelo próprio D. Fernando II. Mas é o Jardim das Lindarias que serve de cenário a uma das inúmeras lendas que envolvem o Palácio da Pena.

A lenda do Jardim da Lindaria

A história é mal contada, mas tem seus encantos. Segundo a lenda, todos os dias após o banho as mouras iam ao Jardim da Lindaria para respirar ar fresco e sentir o perfume das flores e rapazes cristãos escondiam-se para observá-las. As coisas se complicaram quando uma moura se apaixonou por um desses jovens e, por conta disso, acabou sendo morta pelo marido. Desde esse dia, a alma da moura volta ao jardim todas as noites em busca do rapaz por quem se apaixonou.1

Notas

Para saber mais

Palácio da Pena – Sintra – Portugal – Europa

Texto

Fotos

  • (1) Singa Hitam em Wikimedia CC BY 2.0
  • (2) Foto de desconhecido em Wikimedia
  • (3) Ulli Paege em Pixabay
  • (4) Sylvia Leite
  • (5) Carlos Luis M C da Cruz - Domínio Público - Wikimedia

Referências

  • Site oficial do Palácio da Pena
  • Site Cruz Terra Santa

Livros

  • Sintra Lendária - Histórias e Lendas do Monte da Lua, de Miguel Boim
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Marlene
3 anos atrás

Da vontade de retornar a esse lugar mágico

Marlene
3 anos atrás

Obra maravilhosa!!!
Grata por nos proporcionar esse passeio

Marlene
3 anos atrás

Que lindo passeio essa matéria nos proporciona!

sonia pedrosa cury
3 anos atrás

Palácio lindo demais, cheio de história e para minha alegria. Adoro uma lenda!
Adorei, Sylvinha!

Patrícia Veludo
3 anos atrás

Sintra é para mim, que sou portuguesa, a vila mais bonita de Portugal e o Palácio da Pena o monumento mais intrigante que a mesma tem para oferecer, quer pela sua história, beleza e misticismo.