Atualizado em 29/04/2024 por Sylvia Leite
A cidade de Penedo, na margem alagoana do Velho Chico, nasceu em cima de uma enorme pedra e afirma-se por toda parte que essa é a origem do nome do município. Apesar dessa explicação fazer muito sentido, há quem garanta que o lugar foi batizado assim por causa da lenda de Sumé – nome popular de São Tomé – que narra a visita do apóstolo à região para ensinar aos índios o cultivo da terra e pregar o Evangelho.
De acordo com a lenda, São Tomé, ou Sumé, teria deixado o registro de sua visita na pequena ilha de São Pedro, que fica em frente à cidade. Essa prova estaria nas marcas até hoje visíveis em um rochedo, supostamente deixadas pelo apóstolo – a partir de suas pegadas e da ponta de seu cajado.
A ilha de São Pedro é facilmente avistada a partir da Rocheira – nome dado a uma lateral de Penedo onde a pedra sobre a qual a cidade foi erguida fica bem evidenciada. Antigamente, a rocha onde São Tomé teria deixado suas marcas também era visível mas, com o tempo, foi encoberta pela vegetação.
A lenda sobrevive apenas nos registros de pesquisadores e em iniciativas que tentam resgatar sua memória. Caso do trabalho da associação de bordadeiras “Pontos e Contos”, que imprime, em seu artesanato, a história, as lendas e os costumes do lugar e, em 2018, lançou uma coleção de roupas femininas inspiradas na lendária pedra.
A história de Sumé é apenas uma entre as várias lendas que circulam no lugar. Talvez seja a mais
importante por tratar do nome do município, mas Penedo parece uma cidade constituída de passado: seja pelas ruelas do centro histórico, repletas de casarios e igrejas, seja pelas narrativas que se escondem dentro e fora das construções.
As histórias de Penedo
Da mesma forma que o batismo da cidade, a história de seu povoamento também tem mais de uma versão. Pouco se sabe sobre os habitantes locais, mas possivelmente eram Caetés, como os habitantes de outros pontos do São Francisco, que chamavam o rio de Opara, ou Rio-Mar, por causa de sua imensidão. Quanto aos portugueses, há duas versões defendidas por historiadores alagoanos. A mais aceita, diz que foi Duarte Coelho de Albuquerque, herdeiro da capitania de Penambuco, quem primeiro chegou ali em 1560. Uma corrente menor acredita que a povoação tenha sido iniciada por seu pai, Duarte Coelho Pereira, o primeiro donatário da capitania.
Seja qual for a versão correta, todos parecem concordar que o povoado teve sua fundação oficial em 1613 e só foi elevado a vila em 1936, com o nome de Vila do Penedo do Rio São Francisco. Mas a conquista durou pouco. No ano seguinte, os holandeses ocuparam a vila e permaneceram ali por oito anos até serem expulsos com a ajuda de tropas baianas. Os franceses já haviam estado na região, em busca de Pau Brasil, antes mesmo da chegada de Duarte Coelho.
A influência de portugueses, holandeses e franceses ficou gravada especialmente na arquitetura, tombada pelo Iphan, e no gosto pelas artes. Penedo foi uma dos lugares mais florescentes do Nordeste durante o ciclo da cana-de-açúcar e, mesmo antes de ser elevada à categoria de vila, já contava com duas capelas: a de Santo Antônio (1615) e a de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (1634).
Entre as igrejas, talvez a que mais se destaca seja a de Nossa Senhora da Corrente, do início do século 18. A construção combina detalhes arquitetônicos de estilos barroco, neoclássico e rococó, tem piso de cerâmica inglesa e 12 painéis de azulejos portugueses.
Seu nome é atribuído a diferentes razões: ao sobrenome de uma das benfeitoras, Ana Felícia da Corrrente; à aventura de capitão-mor José Gonçalo Garcia Reis, que teria fugido de uma prisão em Portugal e chegado a Penedo com uma corrente preso ao corpo; ou à proximidade em que se encontra do rio, em alusão à sua correnteza.
Conta-se que a igreja foi encomendada por uma família, de sobrenome Lemos, que era contra a escravatura e, por isso, tinha uma passagem secreta para esconder escravos fugitivos.
A presença negra em Penedo
Oficialmente, a Igreja de Nossa Senhora da Corrente não tinha qualquer relação com os escravos, que eram acolhidos em outros santuários, como a Capela de Santa Efigênia – provavelmente, a primeira dedicada os negros em Penedo. Entre outras, havia a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, criada pela Irmandade do mesmo nome, que se dedicava a preservar as tradições religiosas africanas e combater os maus tratos dos negros pelos brancos.
Uma curiosidade em relação aos escravos de Penedo é o fato de entre eles haver integrantes de um grupo conhecido como Malê. Esses escravos eram muçulmanos, sabiam ler e escrever em árabe, agiam de forma altiva e, em geral, eram mais instruídos que seus senhores. Chamavam-se assim porque Malê é a palavra Iorubá pra muçulmanos. Na Bahia, eram também chamados de Nagôs. Tormaram-se conhecidos no país inteiro por causa da Revolta dos Malês – um movimento de caráter social, politico e religioso ocorrido na Bahia, que durou menos de 24 horas porque foi brutalmente reprimido pela polícia.
O hotel São Francisco e o festival de cinema
Mas não são apenas fatos centenários que compõem a linha do tempo de Penedo. Um dos prédios mais simbólicos da cidade atualmente é o do famoso Hotel São Francisco. Quando foi criado, no início da década de 1960, contrastava com o casario colonial. Fazia parte de um esforço de modernização decorrente do crescimento da indústria têxtil e da criação de um porto. Considerado muito moderno para a época, o hotel foi planejado com restaurante e cinema.
Entre 1975 e 1982, hospedou estrelas e diretores que participavam anualmente do Festival de Cinema de Penedo. O Cine São Francisco, localizado em seu subsolo, era a principal sala de projeção do festival.1
Notas
- 1 Leia, aqui no blog, matérias sobre outros lugares de Alagoas: Praia do Francês / Piranhas / Ilha do Ferro / Ilha dos Anjos /
Onde nasci. Morava pertinho da Rocheira, do cine São Francisco e da praça com a Igreja. Meu pai trabalhou na fabrica textil Peixoto Goncalves & Cia. Deu vontade de voltar la. Doces lembrancas
Penedo é, realmente, uma cidade linda…e sabendo um pouco da história, torna-se mais bonita ainda!
Beijão,
Sylvinha!
sonia pedrosa
Bom saber de tudo isso. Pela mensagem que recebi por zap, imagino que esta seja de Alba.
Linda mesmo, Soninha, bjs
estive em Alagoas e não consegui ir a Penedo. Amei seu post sobre as histórias e lendas as Margens do São Francisco. Já me organizei para ir até lá quando voltar a Alagoas
Bom saber que gostou, Hebe. Quando for a Penedo, aproveite para conhecer também Canindé, suas pinturas rupestres e o Museu de Arqueologia do Xingó.
Tenho um cunhado que nascido em Penedo, mora em Recife mas está se.pre lá. Pretendo ir a Natal em Marco e deve ir até lá.
Se for, depois volte aqui e deixe o seu comentário. Tenho quase certeza que você vai gostar.
Nasci em penedo mas não conheço fui morar em são Paulo hoje moro em Belo horizonte estou com setenta e um anos quem sabe ainda tenho chance de conhecer minha cidade (penedo)
Tomara que você consiga ir.Sua terra é linda e cheia de histórias. Quando for, não deixe de comer jacaré. Pena que você não deixou seu nome. Da próxima vez não esqueça, ok?
Que delícia a leitura sobre Penedo. Passei tantas vezes perto dessa cidade e nunca entrei para conhecer. Agora fiquei muito curiosa e da próxima vez, vou programar para dormir uma noite por lá. Obrigada pelas informações.
Você não vai se arrepender. Não deixe de andar à noite pela cidade. É um passeio inesquecível.
Sempre tive uma grande admiração por Penedo, pelo rio, pelo casario colonial, pela história e já a visitei por 3 vezes. Recentemente descobri que lá tenho raízes ancestrais através de meu 6º avô, Jerônimo Cavalcante Dantas, criador e comerciante de gado por volta de 1820.
Como cidadão afetivo de Penedo, lamento a diminuição da navegação através do rio, das balsas e barcos que trazem movimento e beleza à cidade quando da instalação da ponte entre os dois estados.
Obrigada pelo comentário, Gilberto. Penedo é realmente admirável.