Pantheon: um templo aberto para o céu

Tempo de Leitura: 6 minutos

Atualizado em 30/04/2024 por Sylvia Leite

Óculo do Pantheon - Foto José Somovilla do Pixabay - BLOGLUGARES DE MEMÓRIAQuem entra no Pantheon (ou Panteão), na área antiga de Roma, não pode deixar de perceber um detalhe que é incomum à maioria dos templos, especialmente os mais recentes: no meio da cúpula, há uma abertura circular de nove metros de diâmetro pela qual o ambiente recebe luz natural. Acredita-se que esse óculo tenha sido projetado para que os romanos da época se comunicassem diretamente com a esfera divina sem qualquer intermediação humana. Hoje, o Pantheon pertence à Igreja Católica, mas sua abertura circular permanece carregada do significado simbólico que moveu seus construtores e é usada anualmente em uma cerimônia especial no dia de Pentecostes.

Chuva de pétalas em Pentecostes - Foto Divulgação - BLOG LUGARES DE MEMÓRIADurante a celebração, pétalas vermelhas são jogadas dentro do templo através do seu óculo, numa alusão à descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos de Jesus, ocorrida 50 dias depois da Páscoa. A chuva de pétalas é testemunhada por fiéis e curiosos do mundo inteiro, que participam da cerimônia atraídos não apenas pela religiosidade, mas também pela beleza e magia do espetáculo.

O óculo na história do Pantheon

Além de ter mantido sua importância simbólica desde o período considerado pagão até os dias de hoje, a abertura circular do Pantheon teria sido, segundo a tradição oral, de fundamental importância nessa transição. Conta-se que quando a Igreja Católica recebeu a posse do prédio, o lugar era tido pelos católicos como ‘a casa do diabo’ e nenhum cristão ousava sequer chegar perto. Depois de inúmeras tentativas sem sucesso de convencê-los de que não havia diabo nenhum no Pantheon, o papa da época teria usado um recurso cênico envolvendo o óculo para acabar com a crença.

Luz entrando pelo óculo do Pantheon - Foto de Divulgação - BLOG LUGARES DE MEMÓRIASegundo as narrativas orais, o papa convidou os fiéis a visitarem o templo, onde assistiriam ao exorcismo do suposto morador demoníaco. Diante de todos os presentes, ele invocou as forças divinas para expulsarem o demónio daquela casa: Diavolo vattene (diabo vá embora). Nesse instante, um funcionário da igreja escondido num espaço subterrâneo usado para escoamento da água da chuva que entra pelo óculo1, queimou um monte de folhas, deixando a fumaça subir para o pFeixe de luz entrando pelo óculo Foto de Divulgação - BOGLUGARES DE MEMÓRIAatamar do templo e escapar pela abertura circular. A ideia era convencer os fiéis de que o diabo havia se desintegrado e deixado o local. O truque deu certo e o Pantheon passou a ser frequentado pelos cristãos, transformando-se, depois, na Basílica de Santa Maria dei Martire (Santa Maria dos Mártires ou Santa Maria e Mártires).

O relato parece bem convincente, mas traz imprecisões históricas pois Gregório Magno, que teria feito a encenação de exorcismo, foi papa entre 590 e 604 e o Pantheon só foi doado à Igreja no ano 609, quando o papa era Bonifácio IV.

Faz parte do simbolismo do óculo a variação de ângulos que a luz assume ao penetrar, através dele, no interior do templo, que ocorre a cada dia de acordo com o curso do sol. A ideia de comunicação direta entre os fiéis e os deuses ocorreria no momento em que a luz desce verticalmente, sem inclinação, como se ligasse o zênite ao centro do templo.

Uma esfera perfeita

Criquis da cúpula do Pantheon - Imagem domínio público - BLOG LUGARES DE MEMÓRIANão é apenas o óculo que faz do Pantheon uma obra singular. Sua cúpula, com mais de 43,44 metros de diâmetro, é maior que a da Basílica de São Pedro e foi construída sem qualquer sustentação. Para aliviar o peso, que passa de 4.500 toneladas, a cúpula foi moldada em blocos que se assemelham a caixotes, com cavidades no centro. Houve também um escalonamento dos materiais, que são mais pesados embaixo e vão se tornando mais leves nas partes altas, onde se chegou a usar até pedra-pomes, conhecida por sua leveza e porosidade.

Outra curiosidade é a coincidência de medidas entre o diâmetro da cúpula e a altura do templo, de forma que dentro do edifício caberia uma esfera perfeita. Para algumas religiões ou escolas místicas, especialmente as mais antigas, a esfera é um símbolo celeste, enquanto o quadrado simboliza a terra e o octógono marca a transição entre um e outro. No Pantheon, como em outras construções religiosas, a cúpula esférica é sustentada por uma estrutura intermediária octogonal.

Relevos da cúpula - Foto de Divulgação - BLOG LUGARES DE MEMÓRIA 1Um templo de todos os deuses?

Existe a crença de que o Pantheon foi, originalmente, um templo de todos os deuses. Os defensores dessa tese apoiam-se no significado do nome, formado pela combinação do prefixo Pan, que significa todos, com o substantivo Theon, que significa deuses. Mas há controvérsias.

Em sua obra History of Roma, escrita no mesmo século, o senador romano Cassius Dio pondera que o nome Pantheon pode ter vindo do fato do prédio ter sido decorado com estátuas de muitos deuses, inclusive Marte e Vênus, ou por sua cúpula abobadada torná-lo semelhante ao céu.

Fachada do Pentheon - Foto de Maros M r a z (Maros) - BLOG LUGARES DE MEMÓRIATito Lívio, em Ab urbe condita (“Desde a fundação da cidade”), também questiona a ideia de um templo de todos os deuses alegando que além dos sacrifícios e ritos serem específicos a cada um deles, as divindades precisavam ter templos separados para que ficasse claro qual delas tinha sido ofendida quando acontecesse algo como a queda de um raio.

Nave do Pantheon - Foto de Szilas Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAAo derrubarmos a suposição de que o Pantheon foi um templo dedicado a todos os deuses, ficamos sem uma tese para substituí-la, pelo menos no que diz respeito à sua devoção. Resta-nos, então, a lenda segundo a qual o Pantheon foi construído no lugar onde Rômulo, fundador de Roma, foi colhido por uma águia e levado ao encontro dos deuses, onde se tornou o deus romano Quirino.

Um templo de arte

DPlanta baixa do prédio - Imagem R. Lanciani Domínio público Wikimedia - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAepois que foi doado à igreja, na Idade Média, o Pantheon recebeu obras de arte entre as quais se destaca a pintura “Melozzo da Forlì. O prédio passou a ser usado, ainda, como sede da Academia Pontifícia de Belas Artes e Literatura Virtuosa de Roma e para abrigar túmulos de reis e de artistas. O mais famoso é o do pintor Baldassare Peruzzi.

O primeiro Pantheon foi encomendado por Marco Vipsânio Agripa, em 27 antes de Cristo, mas a versão atual foi erguida por Adriano, entre os anos 126 e 128 da nossa era. Sua doação à Igreja, em 609, pode ter sido a razão da boa manutenção que o coloca na condição da obra romana mais bem preservada.2

Notas

  • 1 O prédio possui realmente um canal de drenagem para água da chuva. Para permitir que a água escoe, o piso da sala tem um declive de 30 centímetros
  • 2 Leia, aqui no blog, outras matéria sobre lugares da Itália: Ponte Vecchio / Assis / Murano

Para saber mais

Pantheon – Trevi- Roma – Itália – Europa

Texto

Fotos

  • (1) José Somovilla em Pixabay
  • (2,3,4,e,6) Site Pantheon - Divulgação
  • (5) Domínio Público
  • (7) Maros M r a z (Maros)
  • (8) Szilas em Wikimedia
  • (9) Imagem R.Lanciani - Domínio Público em Wikimedia
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Sidney Menezes
3 anos atrás

Excelente pesquisa. E em um dia especial.

Sidney Menezes
3 anos atrás

Excelente pesquisa. E em um dia especial.

Sidney Menezes
3 anos atrás

Excelente pesquisa. E em um dia especial.

Elizabeth Werneck
3 anos atrás

Uau, adoro esse local. Adorei o post "Pantheon: um templo aberto para o céu". Confesso que é meu lugar preferido em Roma, já fui aí 2 vezes e voltaria outras. Parabens e obrigada por compartilhar

Angela Beatriz Camara Martins
3 anos atrás

O Pantheon é uma obra impressionante. Infelizmente não conheci seu interior. Adorei ler essas informações sobre esse templo aberto para o céu.

sonia pedrosa cury
3 anos atrás

maravilha, Sylvinha. Com a história, o prédio fica muito mais interessante!

Fabíola Moura
3 anos atrás

Pra mim o mais marcante do Pantheon é mesmo a abertura da cúpula a céu aberto. Vi um vídeo sobre a festa de Pentecostes e a chuva de pétalas vermelhas é mesmo linda, imagino qual deve ser a sensação de quem acompanha ao vivo.

Roberto Caravieri
3 anos atrás

Eu amei conhecer o Pantheon, é surreal tanto por fora quanto por dentro uma construção feita dessa forma. A arquitetura é uma coisa formidável. No dia que eu visitei a fila estava bem curtinha e deu pra ficar bastante tempo lá dentro. Abraços

Jane Alves
3 anos atrás

Aprendendo sempre com seus textos diversificados, objetivos, concisos e agradáveis, uma boa surpresa a cada semana. Obrigada, Sylvia.

Hebe Carvalho
3 anos atrás

Ah Sylvia que delícia ler esse post. Eu amo Roma e o Pantheon é mesmo um templo a céu aberto e lindíssimo. Me emocionei quando entrei ai a primeira vez. Adorei ler seu post.

Van
3 anos atrás

O templo Pantheon é fantástico! Lindo, imponente! Eu adorei saber as curiosidades e aprender um pouco mais sobre ele. Muito obrigada pelo post!

Nathalia Geromel
Nathalia Geromel
3 anos atrás

Sylvia, eu acho o Pantheon um templo lindo também !! É um lugar cheio de curiosidades e rende boas fotos!! Um verdadeiro templo aberto para o céu, você bem definiu

Gisele Prosdocimi
3 anos atrás

O Pantheon, este templo aberto para o céu, como seu post cita, é merecidamente uma das atrações mais importantes e encantadoras de Roma. Fiquei maravilhada ao conhecer sua arquitetura e seu interior repleto de simbolismo e seus mármores raros. Vale a pena visitar!

Deyse
Deyse
3 anos atrás

Simplesmente amei esse texto carregado de histórias e detalhes impressionantes. Sem dúvida, o Pantheon é sensacional, um verdadeiro templo aberto para o céu.

VICTORIA M FARINA
3 anos atrás

Visitei diversas vezes o Pantheon em Roma e, o que sinto, é que a energia do lugar muda MUITO dependendo do seu humor e hora do dia. Adorei saber mais sobre a história e ver mais fotos desse lugar lindo ❤