Atualizado em 29/04/2024 por Sylvia Leite
As unidades do Projeto Tamar – apresentadas como Museus a céu aberto e espalhadas pelo litoral brasileiro – nos lembram pequenos oceanários nos quais se pode observar espécies marinhas e obter informações sobre suas principais características. Não há dúvida de que elas cumprem também esse papel, mas a estrutura que se apresenta ao visitante é apenas a ponta de um iceberg formado por ações de preservação que incluem desde a pesquisa e a sensibilização ambiental, até um trabalho de apoio ao desenvolvimento sustentável das comunidades costeiras.
Tudo começou na década de 1970, quando estudantes de Oceanografia, em viagem de pesquisa ao Atol das Rocas, no litoral do Nordeste, registraram a matança de tartarugas por pescadores locais. As imagens foram enviadas às autoridades ambientais, já conscientes da necessidade de preservar espécies marinhas em extinção, e com isso nasceu, em 1980, o Programa Brasileiro de Conservação das Tartarugas Marinhas depois batizado como Tamar.
O nome – que contrai e une os termos tartaruga e marinha – nasceu da necessidade de uma palavra curta para ser impressa nas placas de metal que identificam espécies e são usadas para monitoramento de rotas migratórias e estudos de biometria. E apesar de ter surgido de uma questão operacional, suas características de fácil pronúncia e memorização parecem ter contribuído para a divulgação do projeto, que a partir daí foi ganhando cada vez mais visibilidade.
As vitórias do Projeto Tamar
O trabalho de proteção é feito em praias de nove estados brasileiros1 e nos últimos dez anos o volume anual de desovas passou de 11,5 mil para 217,8 mil aproximadamente. Carca de 30 mil ninhos são protegidos a cada ano, com preservação de cinco espécies: de couro, verde, cabeçuda, de pente e oliva.
Uma das principais ameaças à preservação das tartarugas é o trânsito de veículos motorizados nas praias de desovas. Eles provocam atropelamentos e assustam as fêmeas, que fogem sem colocar seus seus ovos. O peso dos veículos pode compactar os ninhos já enterrados na areia, dificultando o nascimento dos filhotes. E as marcas deixadas pelos pneus na areia tendem a dificultar o acesso dos recém-nascidos ao mar.
As ameaças vêm também da fotopoluição, ou iluminação articicial. Ao perceberam a luz nas praias, as tartarugas deixam de desovar. Mesmo quando há a desova, a luz faz seus estragos pois, ao nascerem, os filhotes devem dirigir-se ao mar, guiados pela luz docc horizonte. Quando a praia é iluminada, eles ficam desorientados: são atraídos pela luz artificial e seguem na direção contrária, sendo atropelados ou devorados por predadores.
A fim de reduzir a fotopoluição, o Projeto Tamar conseguiu proibir a colocação de novos pontos de luz nas praias de desova e, no caso de localidades em que a situação já era irreversível, faz campanhas de incentivo à substituição das luminárias convencionais por outras desenhadas por especialistas do projeto com o objetivo de evitar a incidência direta de luz sobre a praia. A circulação de veículos motorizados pelas praias de desova também está proibida em vários locais.
Graças a essas iniciativas, o Projeto Tamar conseguiu devolver às tartarugas um ambiente equilibrado na maioria das praias de desova e hoje 97% dos ninhos permanecem onde foram postos até o nascimento dos filhotes. Os 3% restantes – geralmente desovados em praias iluminadas, com erosão ou com trânsito de veículos – são recolhidos pelas equipes do projeto para o que
eles chamam de Desovas Protegidas. Ao fim do ciclo – que dura de 45 a 60 dias entre a desova e o nascimento – as tartaruguinhas recém-nascidas são soltas na praia e os ninhos são abertos para a coleta de dados biológicos.
Não basta nascer
As ameaças à desova são apenas uma parte do problema enfrentado pelo Projeto Tamar. De cada mil filhotes, apenas um ou dois atingem a idade adulta, com aproximadamente 30 anos. São devorados por predadores, adoecem ou morrem de fome.
Mas de acordo com os biólogos, o problema mais grave atualmente é provocado pela atividade pesqueira, especialmente as redes de arrasto para camarão, onde as tartarugas ficam presas e acabam morrendo por não conseguirem subir à superfície para respirar.
Uma das iniciativas do Projeto Tamar para tentar solucionar a ameaça da pesca incidental foi o desenvolvimento, em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco, de uma espécie de grade que filtra a entrada da rede, liberando apenas a passagem de pequenos animais. O dispositivo já está sendo usado em alguns estados do Nordeste, mas o problema ainda está longe de ser resolvido. Depende da adesão dos pescadores que precisam desembolsar uma pequena quantia para instalar o dispositivo em suas redes e isso demanda um trabalho continuo de conscientização.
O trabalho comunitário
A conscientização, alias, tem sido a principal arma do Projeto Tamar. Desde o início, as equipes de biólogos, veterinários e outros profissionais perceberam que para salvar as espécies em extinção era preciso contar com a participação da comunidade e que isso exigia não apenas ações educativas, mas também a busca de alternativas não predatórias para a subsistência dos pescadores e de suas famílias.
Entre as ações de interação com a comunidade realizadas pelo Projeto Tamar estão o apoio a creches e escolas, incentivo a tradições regionais como bordados, rendas, capoeira e grupos folclóricos. São criadas, ainda, oportunidades de profissionalização para mulheres e jovens nas confecções e oficinas que elaboram produtos personalizados para as lojas do projeto.
Tartarugas e mais
Com o passar dos anos, outras espécies foram agregadas ao Projeto Tamar, especialmente os Tubarões. Embora as tartarugas sejam o carro-chefe do trabalho de preservação, muitos animais de diferentes espécies têm sido reabilitados nas unidades do projeto. Isso, sem falar naqueles que compõem seus oceanários com objetivos educacionais.
Nas unidades de Aracaju e Praia do Forte, uma exposição denominada Submarino Amarelo e decorrente de uma pesquisa com anzóis circulares – para conhecimento dos danos provocados por sua utilização – mostra espécies vivas que habitam o fundo do oceano, a aproximadamente 550 metros de profundidade. 2
Notas
- 1 Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Sergipe, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina
- 2 Leia, aqui no blog, sobre outras ações de proteção à fauna, à flora e à diversidade: Parque dos Falcões / Arara-azul-de-lear / Horto de Caípe Velho / Jardim Botânico do Rio
Projeto Tamar – Brasil – América do Sul
Fotos
- Sylvia Leite
Fotos
- Sylvia Leite
- Obs: (As fotos foram feitas nas unidades de Aracaju (1,2,5,6,7 e 8) e Arembepe (3 e 4)
Referências
O Projeto Tamar merece o nosso respeito! É um exemplo de experiência bem sucedida. Palmas para Guy Marcovaldi!
Considero o TAMAR um projeto fundamental. Principalmente nestes tempos em que a maioria das pessoas ficam boiando nas superficialidades. Porque o TAMAR aprofunda e expande.
Com a diversidade de ações de preservação, incluem a base científica e tecnológica com pesquisa; tem uma proposta educacional com sensibilização ambiental; faz um lindo trabalho social de apoio ao desenvolvimento sustentável das comunidades costeiras.
À céu aberto e nas profundezas do Oceano, o Projeto TAMAR colabora para que possamos reverenciar e honrar a vida nas profundezas do Oceano, na beira da praia. Dentro e fora de nós.
Obrigada pelo comentário. Abraço
É verdade, Soninha. Uma beleza!
Excelente matéria, Sylvinha! O Projeto Tamar é referência na proteção das tartarugas marinhas e no trabalho socioambiental que desenvolve nas comunidades costeiras.
Abraços,
Val Cantanhede
Projeto TAMAR é sensacional. Merece apoio de todos.
Uma história da qual todos os autores devem se orgulhar!! Um projeto que deu muito certo a despeito de muita inveja e tentativas de extingui-lo! Viva o TAMAR! Longa vida a este projeto! As tartarugas e o Brasil agradecem!!!
Viva o Tamar!!! Obrigada pelo comentário. Volte sempre!
Merece, sim. Obrigada pelo comentário.
Isso mesmo, Val. Temosque apoiar.