Atualizado em 08/05/2024 por Sylvia Leite
Os Novos Baianos não estão mais lá. Nem Tim Maia, nem Rita Lee. A aldeia já não recebe visitantes famosos como Janis Joplin, Mick Jagger, Keith Richards ou Roman Polanski. Arembepe – praia do município de Camaçari, no litoral Norte da Bahia – deixou de ser a morada dos sonhos de jovens rebeldes e até a paisagem perdeu parte de seus encantos, mas nada foi capaz de destruir a memória daqueles anos de liberdade.
Quem ouviu os Beatles, usou roupas indianas ou, de alguma forma, participou do movimento hippie, não consegue ficar indiferente a esse lugar que até hoje proíbe a entrada de carros, mantém o chão de areia e as crianças soltas na rua. Seja na gaita, no balanço, ou por meio de outro veículo qualquer, cada um encontra sua própria maneira se transportar para os tempos telúricos.
Paz e amor
A recordação nos leva às décadas de 1960/1970. Respaldados pelos efeitos da maconha, ácidos e plantas alucinógenas, como Beladona e Peiote, jovens do mundo inteiro protestavam contra a violência, rejeitavam o consumismo e pregavam o amor livre. Tudo sob o lema “Paz e amor” e em sintonia com o neurocientista de Harvard Timothy Leary, que divulgava os benefícios terapêuticos e espirituais do LSD.
Praias e montanhas eram os locais escolhidos para acampamentos temporários ou moradias. Os que se instalavam permanentemente, assumiam um modo de vida comunitário, influenciado pela cultura oriental, com hábitos que incluíam do uso de incenso à prática da meditação. Os hippies vestiam camisas coloridas, roupas indianas, calças com boca de sino rasgadas naturalmente pelo uso. Inspiravam-se em uma estética psicodélica, que remetia a experiências místicas e transcendentais.
No auge dessa revolução de costumes, um espetáculo musical massificou a cultura hippie no mundo inteiro. “Hair” contava a história da “Tribo” – um grupo de cabeludos que se rebelaram contra a Guerra do Vietnã e faziam campanha contra o alistamento militar. Dois anos depois, o movimento foi coroado pelo festival mais famoso dos tempos modernos, realizado na vila norte-americana de Woodstock.
A aldeia de Arembepe foi o primeiro reduto hippie do Brasil. Quando os ‘malucos’ começaram a chegar, não havia ninguém por ali. Eles foram erguendo cabanas de palha ou aperfeiçoando palhoças deixadas por pescadores. Viviam em total liberdade, muitas vezes sem roupa, entre o mar, que se curvava em uma enseada, e o rio Capivara, que corria atrás das dunas. Comiam frutas e peixe frito. Tocavam, cantavam, faziam colares, conversavam e transavam longe da repressão política da Ditadura Militar que corria solta nas cidades, especialmente nas capitais.
Ao lado de Goa, na Índia, e Machu Picchu, no Peru, Arembepe alcançou o status de uma das Mecas da Contracultura. Lembram os veteranos que Janis Joplin perambulou por suas praias com uma garrafa de cachaça nas mãos e se encantou com o lugar. O sentimento parece ter sido recíproco. Entre tantos nomes de visitantes famosos, o seu foi escolhido para batizar a vila.
Mick Jagger também deixou suas marcas nas areias de Arembepe. Conta-se que, junto com o guitarrista Keith Richards, chegou a comprar uma cabana na aldeia, conhecida como a Casa do Sol Nascente, e fez uma festa de reveillon que alguns consideram inesquecível, mas sua passagem por lá foi polêmica e, segundo alguns frequentadores, ele nunca se integrou verdadeiramente com os hippies da Bahia. Apesar de tudo, a foto de 1968, em que aparece tocando violão, virou marco da fundação da aldeia. A justificativa é que, embora os hippies já estivessem ali há mais tempo, a foto de Jagger é o documento mais antigo.
Um museu a céu aberto
Cinquenta anos se passaram. Nesse meio tempo, John Lennon decretou o fim do sonho e o mundo passou por enormes transformações. Alguns sonhos da época continuam vivos e foram absorvidos por movimentos mais recentes como a Permacultura , a Agrofloresta e as Ecovilas que além incorporar alguns princípios da Contracultura, incluem também tecnologias alternativas e novas preocupações. Outros foram absorvidos e institucionalizados, dando origem a costumes sexuais mais flexíveis e a movimentos massivos de proteção ambiental ou contra a discriminação das minorias.
Mesmo sem o frescor dos anos 1960/1970, Arembepe consegue preservar pelo menos uma parte de sua filosofia original: paz, amor, vida simples e produtos artesanais. Mas se nos tempos de efervescência a aldeia pertencia apenas aos jovens rebeldes, hoje é considerada um patrimônio cultural da Bahia. Os hippies envelheceram e não vivem mais de frutas e peixes. A aldeia tem bares que vendem cerveja e refrigerante e os artesãos estão organizados em uma associação. Os colares, pulseiras e produtos de couro são vendidos principalmente aos turistas.
Muitos dos que passaram algum dia por alí, reuniram-se para preservar a memória do seu sonho de juventude e, fiéis aos princípios comunitários, escreveram um livro a 400 mãos (e 200 cabeças), organizado pelo escritor e publicitário Luiz Afonso e pelo produtor cultural e publicitário Sérgio Siqueira, usando, para isso, uma página do Facebook. Também faz parte do movimento de preservação a realização de festas noturnas a céu aberto – os famosos ‘luaus’ – especialmente no verão.
A aldeia hippie de Arembepe pode não ser mais aquela, mas continua resistindo e já se transformou em um importante museu vivo da contracultura.
Arembepe – Camaçari – Bahia – Brasil
Fotos
- Sylvia Leite (fotos atuais)
- Gettyimages ( foto antiga de Mick Jegger postada pelo Correio 24 horas como imagem liberada para divulgação )
Boa reportagem e muitas recordações, desse tempo forte de mudanças da juventude. Muitos anos se passaram e vemos que a vida na aldeia continua viva, com aqueles que acreditam,0 e vivem felizes. Parabéns.
Adorei! Realmente, traz muitas lembranças. Deu saudades de lá
Massa! 🙂
Muito bom Silvinha.Apesar de não ter vivenciado isso, achei o máximo sua reportagem. Beijo, Aida Carrera
Parabéns, gostei mesmo!
Ótimo, Sylvinha!!!Lembro de Cleomar…
Nosso querido Cleomar. Que saudade!
Obrigada.Da próxima vez, deixe seu nome rsrsr
Valeu, Aida. Beijos
Valeu, Mercedinha! bjs
Então aproveite as lembranças. Beijos
Valeu, Nena
Muito legal poder conhecer um pouco mais sobre o assunto. Adorei. Bjs.
Lívia
Valeu, Lívia, beijos.
Obrigada, Maria Helena. Adoro saber que você está aqui toda semana.
Mais uma vez surpreende, uma história muito boa, obrigado!
Beleza, Sylvinha! Sempre nos surpreendendo com suas histórias maravilhosas. E essa então que marcou uma época e a juventude rebelde que sonhava com um mundo só de paz e amor. Amei!
Beleza, Sylvinha! Sempre nos surpreendendo com suas histórias maravilhosas. E essa então que marcou uma época e a juventude rebelde que sonhava com um mundo só de paz e amor. Amei!
Eu que agradeço por sua presença constante. Beijão!
Que bom, Gustinha. Obrigada pelo comentário.
Respondi acima. Beijos
Morei em Salvador de 1977 a 1982. Nao havia mais o movimento Hippie, mas Arembepe era sinonimo de uma Praia maravilhosa e mais "deserta" e eu adorava essa combinacao. Quando ppdia ia desfrutar do lugar. Boas lembranças da Bahia. Realmente é um lugar de memórias. Parabéns Sylvia pela escolha ecletica dos lugares de memória. Aigusta Leite Campos
Obrigada, Gusta, volte sempre! Beijos
CHEGUEI VERÃO 71/72a cidade fervia a ALDEIA SUPER LOTADA , resolvemos ficar do outro lado da vila, depois de DNA Seja no coqueiral la permaneci até 75, e vai no MUNDO Tivemos um rest. PerolaNegra, um dos moradores segue por la e MISSIVAL DOURADO foi no Sucruiu de Arembepe que vi as primeiras NAVES em 72.SALVE SALVE BAHIA a bênção AREMBEPE
Salve! Belo depoimento. Experiência viva. Só faltou deixar o nome. Se puder se identificar, vai ser legal. Valeu!
Viajei com suas palavras para um tempo que nao tive a oportunidade de vivenciar ss ouvir falar. Mas em sua matemat parecia que estava dentro desta Vila que hoje pode nao ter mais nenhum famosos mas continua mágica. "….Cantava Viva à Liberdade…." Engenheiros do Hawaii
ParabePa!!!!
OlO amiga, aqui e a Cassandra não poderia deixar de opinar sibre sua brilhante matéria
✍Viajei com suas palavras para um tempo que nao tive a oportunidade de vivenciar ss ouvir falar. Mas em sua matemat parecia que estava dentro desta Vila que hoje pode nao ter mais nenhum famosos mas continua mágica. "….Cantava Viva à Liberdade…." Engenheiros do Hawaii
Parabéns!!!!
Obrigada, Cassandra. Fico feliz que tenha gostado. Toda quinta tem matéria nova. Espero que se torne uma leitora assídua.
Muito boa matéria, Sylvia. Viajei no tempo, como muitos dos que a leram. Nunca estive lá mas já guardei Arembepe nas minhas boas lembranças. Parabéns!
Obrigada, Leila! Toda quinta tem matéria nova. A de hoje é sobre um ritual indiano. Beijos
Estive em Arembepe 2002 no verão, gostei D+, visitei rápido a Aldeia, nem imaginei que pessoas tão famosas tinham ido pra lá! Parabéns pela reportagem! Abraços Robson Ventania!
É legal saber essas coisas, não é? Parece que muda a cara do lugar. Obrigada pelo comentário. Volte sempre.