Atualizado em 29/04/2024 por Sylvia Leite
Diz uma lenda dos povos Caetés, muito conhecida entre moradores de Tamandaré, no litoral Sul de Pernambuco, e transmitida nas escolas locais, que tempos atrás ocorreu um dilúvio provocado por Tupã, o deus dos trovões. Da mesma forma que no dilúvio bíblico 1, apenas um homem foi alertado sobre o desastre. Isso permitiu que ele construísse uma grande embarcação para abrigar-se até o final da tempestade e pudesse, depois, repovoar a terra. O homem escolhido era um pajé, conhecido pelas gerações futuras como ‘tamoindaré’ (do Tupi tab-moi-inda-ré) – que significaria o repovoador2. Essa lenda é considerada a principal explicação para o nome da localidade, chamada assim muito antes da chegada dos primeiros colonizadores, no século 16.
Há ainda outras duas versões para o batismo da localidade como Tamandaré. Uma delas, igualmente mitológica, também fala em inundação, mas o desastre teria sido provocado pelo próprio pajé, ao cavar uma fonte que transbordou e alagou toda a região. Para sobreviver, ele teria subido em uma palmeira junto com sua mulher e permanecido no alto até as águas baixarem. A outra versão é levantada por léxicógrafos a atribui a origem da palavra Tamandaré ao vocábulo tupi ‘tamandûaré’ que significa ‘tamanduá diferente’ (tamanduá + é).
Mesmo não havendo consenso sobre o surgimento do nome, as três versões apontam para uma origem indígena e isso põe por terra uma versão divulgada em outras regiões do Brasil segundo a qual a localidade de Tamandaré teria recebido esse nome depois da visita de Joaquim Marques Lisboa – considerado o Patrono da Marinha Brasileira – cujo nome de guerra era Almirante Tamandaré.
Tamandaré e o Almirante
Por causa desse gesto, o imperador atrelou Joaquim Marques Lisboa ao então povoado de Tamandaré e, ao conceder-lhe títulos de nobreza, usou sempre esse nome. Foi assim que Joaquim tornou-se Barão, Visconde, Conde e depois Marquês de Tamandaré. E quando conquistou o titulo de almirante, que é o posto maior da Marinha, seu nome de guerra passou a ser Almirante Tamandaré.
A disputa com os holandeses
Dois fortes foram construídos pelos portugueses na região: um deles, batizado como Forte da Santa Cruz de Tamandaré, foi erguido durante o período da segunda invasão holandesa, entre 1630 e 1654. Era um forte do tipo trincheira, feito de barro e madeira, e foi destruído pelos invasores.
O outro, batizado como Forte de Tamandaré, é posterior à retirada dos holandeses e foi feito para proteger a costa de novos invasores ou de um eventual retorno dos próprios holandeses. Esse forte permanece até hoje, agora sob o comando da Marinha do Brasil e rebatizado como Forte Santo Inácio de Loyola, segundo os historiadores em decorrência da devoção dos tamandareenses a Santo Inácio. Nele ainda podem ser vistos canhões originais voltados para a baía de Tamandaré, a fonte no meio do pátio, um farol construído posteriormente e a Capela de Santo Inácio – a mais antiga do município, construída no século 18 – onde são rezadas missas semanais.
A saga de Tamandaré
Embora tenha sido batizada muito antes da chegada dos portugueses, Tamandaré passou por muitos estágios até tornar-se uma cidade independente, no final do século 20. Antes do ano 1.000, era habitada por índios de idioma macro-jê que foram expulsos pelos Caetés, vindos da Amazônia. No início da colonização, tornou-se uma grande propriedade rural que adotou o nome indígena do lugar e, pouco a pouco, uma vila de pescadores foi se formando à beira-mar. Em 1905, a povoação foi elevada a distrito de Rio Formoso e somente em 1995 é que tornou-se um município.
Com sua antiga sede, Tamandaré compartilha a história de luta entre portugueses e holandeses. Quem passeia de barco pelo estuário que banha os dois municípios, avista uma grande cruz no alto de um morro localizado em Rio Formoso. É o monumento à Batalha do Reduto – episódio em que os holandeses destruíram um forte de campanha e mataram um batalhão inteiro, deixando escapar apenas o comandante, que é homenageado, anualmente, no dia 7 de fevereiro.
Os dois municípios podem dividir, também, a atenção dos visitantes que se interessam por igrejas. Em Tamandaré, além da Capela de Santo Inácio, localizada dentro do forte, destaca-se ainda a Capela de São Benedito, em sua famosa Praia dos Carneiros, que virou cartão postal do município. Já em Rio Formoso, o foco está distribuído entre três igrejas: a de São José, que fo construída no século 17, dentro de uma propriedade rural, e tornou-se a igreja matriz da cidade; a de São Benedito, destinada aos escravos; e uma terceira dedicada a Nossa Senhora do Livramento – um dos títulos dado à mãe de Jesus em alusão à sua capacidade de interceder pelos pecadores.
Rio Formoso abriga, ainda, a Comunidade Quilombola do Engenho Siqueira – reconhecida pela Fundação Palmares – que reúne 150 famílias remanescentes de escravos vindos de mais de 20 engenhos da região depois da decretação da Lei Áurea. Entre as particularidades da comunidade está um museu, ainda em formação, que reúne ferramentas de trabalho, utensílios domésticos e outras peças utilitárias dos quilombolas, em um quartinho que fica grudado à casa de seu organizador – o funcionário público e artesão Moacir Correa de Santana.
A Tamandaré das águas
Tamandaré – Pernambuco – Brasil – América do Sul
Fotos
- (1, 2, 4, 5, 6, 7, 8 e 9) Sylvia Leite
- (3) Acervo do Forte Santo Inácio de Loyola
Referências
- Livro: Tamandaré, A história de um município, de Maria do Carmo Ferrão Santos
Consultoria:
- Maria do Carmo Ferrão Santos, bióloga e estudiosa da história de Tamandaré
- Manoel Pedrosa, secretário de Meio Ambiente de Tamandaré
Vídeos:
- A origem da ocupação de Tamandaré
- Tamandaré, a Capital do Império
- A emancipação político-administrativa de Tamandaré
Apoio:
- Busy e João Luís
Para saber mais
- Descubra o que fazer na Praia de Carneiros em postagem do blog de Elizabet Werneck
Sylvinha, muito legal, conhecer essa história! Adorei!
Um beijo grande,
sonia pedrosa
Que delícia de matéria, Sylvinha!
Da próxima vez que viajar à Pernambuco irei conhecer Tamandaré.
Abraços
Val Cantanhede
Valeu, Soninha! beijos
É interessante mesmo. Obrigada pelo comentário. Valeu!
Obrigada, Val. bjs
Lugar lindo, mas não sabia destas histórias e lendas.
Lindo mesmo. Obrigada pelo comentário. Da próxima vez, não se esqueça de deixar seu nome, ok? É bom saber com quem estamos falando.
Conheço Tamandaré, sou de Pernambuco e duas vezes ao ano visito a cidade! Quem vier visitar ficará maravilhado, venham pois! Vc falou tudo, foi muito feliz nas declarações. Um abração!
Obrigada pelo comentário. Da próxima vez não se esqueça de deixar seu nome. Abraço!
Já fui a Tamandaré a passeio e nunca soube da história da cidade. obrigada por ter compartilhado de um modo tão didático e interessante. 🙂
Eu que agradeço pela leitura e pelo comentário. Volte sempre.
Obrigada por compartlhar nossa história, sou Marinheira e fiquei feliz com a menção ao nosso Patrono.
Que bom que você gostou, Lucimeri. Obrigada pelo comentário. Fique atenta porque breve publicaremos uma matéria sobre a igrejinha de Carneiros, que será um complemento a essa matéria sobre Tamandaré.