Atualizado em 02/05/2024 por Sylvia Leite
As casas são caiadas como em todos os outros Pueblos Blancos1 da Andaluzia. A história também é semelhante. Os primeiros sinais de assentamento urbano vêm de longe – do período Neolítico – e as influências romanas, árabe e cristã estão igualmente presentes. Assim como em algumas das outras vilas brancas, a localização serrana favorece a prática de esportes radicais. O que diferencia Algodonales de todos os outros povoados dessa rota gaditana são seus violões flamencos (guitarras flamencas para os espanhóis) produzidos artesanalmente pela família Bernal.
A tradição familiar não é tão antiga, se comparada com a origem do lugar, mas já atravessa gerações. O fundador da oficina de luthieria, Valeriano Bernal, começou a aprender o ofício aos oito anos de idade com o primo Francisco Ramírez Leo, na época um dos mais famosos da Espanha. Aos 14, concluiu sua primeira guitarra, que vendeu por 500 pesetas. O filho, Rafael Bernal, seguiu o exemplo do pai, falecido em 2018, criou sua própria marca – Rafa de Valeriano – e hoje toca a empresa com ajuda da irmã Chari Bernal.
A oficina de luthieria
Para quem não é luthier ou músico, entrar em uma oficina artesanal como a dos Bernal é uma experiência cheia de surpresas. Peças de madeira dos mais diversos formatos penduradas na parede ou dispostas em cima de mesas nos revelam a complexidade contida em um violão clássico ou em uma guitarra flamenca.
O material varia de acordo com a parte do instrumento e a função que desempenha na produção dos sons. No tampo, por exemplo, que é considerado a alma do violão, seja ele clássico ou flamenco, são utilizadas madeiras pouco densas, mas muito resistentes, como abeto e cedro do Canadá. Já a parte da frente do braço, conhecida como escala, e que os espanhóis chamam da diapasón, é comumente feita com madeira de ébano.
As variações ocorrem, também, em função do tipo de instrumento. Se o violão é flamenco, por exemplo, o aro (parte lateral) e o fundo, considerados responsáveis pela “cor’ dos sons que o violão produz, são feitos geralmente em cipreste ou em pau santo da Índia.
É surpreendente, ainda, descobrir que uma cidade com menos de dez mil habitantes fornece violões para o mundo inteiro seja por meio de pedidos diretos ou pela venda em lojas autorizadas. E que uma oficina familiar de luthieria artesanal é capaz de produzir até 150 violões por ano.
Todo esse sucesso talvez se deva, em parte, ao fato da província de Cádiz, onde se localiza Algodonales, ser considerada o berço da dança e da música flamencas ou, pelo menos, uma das partes da Espanha em que essa expressão artística -, nascida a partir de influências ciganas árabes e judaicas – alcançou maior expressão popular.
Foi em Algodonales que Valeriano Bernal aprendeu o ofício com o tio e, apesar de sua maturidade profissional ter sido alcançada na Bélgica, onde trabalhou por cerca de 14 anos e conseguiu a montar sua prímeira loja, é lá que a oficina da família está localizada desde 1982.
Mas, provavelmente, tem igual peso a paixão de pai e filho pela música e o aprendizado que tiveram ao atender pedidos de artistas experientes e famosos como Paco de Lucía, Paco Cepero, Tomatito ou Alejandro Sanz.
Embora constituam o diferencial de Algodonales, as guitarras flamencas não são sua única atração. Depois da visita à oficina dos Bernal, vale a pena passar a pé pelas ruas estreitas e sinuosas, olhando as casas branquinhas, e encontrando, vez por outra, uma das fontes que compõem o fundo sonoro da cidade. Ainda dá para conhecer a igreja matriz de Santa Ana e os sítios arqueológicos Santa, Chamusquina y Castillejo, do período Neolítico.
Notas
- 1 Leia, também, matéria sobre outros lugares da Espanha: Segóvia / Ronda / Arcos de La Frontera / Alhambra / Algodonales / Cádiz
Aldgodonales – Cádiz -Andaluzia – Espanha
Fotos
- (1) Trip Advisor /cortesia
- (2 e 5) Site Valeriano Bernal
- (3 e 4) Sylvia Leite
Consultoria dos músicos
- Carlos Brisolla
- Dudu Barreto
- Thais Helena Ramacioti.
Referências
- Site do Valeriano Bernal
Livros
- Guitarreros de Andalucía: artistas para la sonanta, de Luís F. Leal Pinar
Estive nesse pueblo em 93 e fui aí, conhecer o lugar das famosas guitarras flamencas. Muito boa matéria. Parabéns.
Estupendo trabalho de Luterua!!
Muito bom receber essas informações sobre as preciosas guitarras flamencas de Aldgodonales. E que essa pequena cidade pertence à Andaluzia, região encantadora da Espanha. Obrigada
Belo registro, Sylvinha! Parabéns!
Beijo
sonia pedrosa
Adoraria saber quem é o autor do comentário. Obrigada
Eu que agradeço, Vânia. Beijo
Obrigada, Soninha. Pela leitura, pelo comentário, pela assiduidade. beijo
Obrigada, Vi. É bacana demais o atelier dos Bernal, não é ?
Que especial conhecer sobre este destino e sua arte! Eu não conhecia nada sobre Algodonales, a terra das guitarras flamencas. Estou encantada!
É realmente encantador. Não é um lugar muito divulgado entre nós, mas na Europa os Pueblos Blancos são muito conhecidos e Algodonales é um deles.
Adorei saber mais sobre a terra das guitarras flamencas. Não conhecia Algodonales.
Pouca gente conhece. Eu tive essa oportunidade porque passei um tempo em Arcos de La Frontera aprendendo a fazer mosaicos islâmicos e Arcos é um Pueblo Blanco, assim como Algodonales.
Adorei essa post de Algodonales a terra das guitarras flamencas, ainda não conheço a Espanha, mas com certeza irei ver tudo isso de perto quando for até la. Parabéns pelo post
Obrigada, Hebe, vá mesmo. Os Pueblos Bancos são todos encantadores.